Mestre Manin faz 95 anos de história e carimbó celebrados em Ponta de Pedras no Marajó

Foi da urgência em não deixar a memória se apagar que nasceu o mini documentário “Mestre Manin”, exibido dia 9 de maio, data em que o músico completou 95 anos. Tive a sorte de estar no lugar e na hora certa, para acompanhar essa homenagem — um encontro de gerações marcado por afeto, batuque e resistência.

Manoel Gouveia Bandeira, figura importante da cultura popular de Ponta de Pedras, na Ilha do Marajó, é um músico autodidata, compositor, trombonista, banjista, referência para a música tradicional da região.

As composições de Mestre Manin navegam por carimbós, cordões de pássaro, bois e peças religiosas. Grande parte dessa obra,  guardada em sua memória – um tesouro vivo, que agora recebe atenção e segue em processo de registros na comunidade.

A ideia em realizar o documentário sobre o mestre partiu de Jacqueline Schalken, funcionária da prefeitura, além de roteirista do filme e produtora cultural de Ponta de Pedras, no Marajó.

“Já perdemos alguns mestres de Ponta de Pedra, que se foram sem registros. É tão importante preservar essa memória quanto também dar reconhecimento a eles em vida. São histórias, músicas, composições. Então paramos tudo e fomos fazer”, contou Jacqueline, emocionada.

Mestre Manin (Doc. 8 min. Dir. Henrique Garcia)

O lançamento foi realizado na sede da Associação Musical Antônio Malato (AMAM), fundada pelo próprio Manin para incentivar o ensino da música e fomentar a cultura local.

Tanto o documentário quanto o evento, na manhã de sexta-feira, contou com apoio da prefeitura do município, por meio de sua secretaria de cultura. O secretário Pedro Nicácio destacou a urgência de valorizar os mestres da cultura popular. “Esta é uma forma de preservar a memória e retribuir tudo que o Mestre Manin já fez por nossa cultura.”

O filme tem oito minutos e foi construído entre visitas a casas de amigos, gravações noturnas e esforço coletivo. “É uma inspiração ver o resultado. É um orgulho estar nesse projeto”, disse Henrique Ferreira, convidado por Jacqueline para dirigir o filme. Ele se define não apenas como técnico audiovisual, mas como alguém movido pela paixão pela memória.

Com semblante sereno e olhos atentos, Mestre Manin acompanhou a exibição com alegria. Entre causos e lembranças, contou como pegava o banjo ainda menino, guiado apenas pelo desejo de fazer música.

“Puxei do meu pai. Ele era mestre de banda. E eu sempre amei música. Música é coisa que faz a pessoa se esquecer da tristeza”, afirmou o mestre.

Doc Mestre Manin – Registro do lançamento/Luciana Medeiros

O documentário também se conecta a uma preocupação coletiva. “A ideia era antiga, mas a correria fazia o projeto ficar pra depois. Quando perdemos outros mestres, vimos que era hora de agir. E fizemos com amor”, compartilhou Henrique na apresentação.

Entre os presentes, um grupo em especial dava o tom da festa: o Sipuada Sucupira, coletivo de jovens músicos e dançarinas de Ponta de Pedras que tem Mestre Manin como guia e fonte. Foi com o ritmo do grupo que o carimbó se espalhou pela Associação Musical Antônio Malato (AMAM), encerrando a manhã com a força ancestral de um legado que vive no presente.

“Ele é nosso mestre. A gente visita, conversa, aprende. É nossa referência. Ele vai montando as músicas e dá pra gente. A gente expande esse repertório pra fora também”, afirma Mateus Ferreira, integrante do grupo formado por jovens músicos e dançarinos de Ponta de Pedras.

Sipuada marajoara guiada por Mestre Manin

Sipuada Sucupira, na praia da Mangabeira (doc.)

Guiado por um mestre da tradição, o grupo tem em Mestre Manin sua principal referência. Ele é o coração do repertório que pulsa nos palcos e terreiros por onde o Sipuada passa. A iniciativa surgiu há quatro anos.

Foi em meio à pandemia, em 2021, que nasceu o grupo, um coletivo musical de Ponta de Pedras que hoje se tornou uma das principais forças de preservação e difusão do carimbó marajoara.

A iniciativa surgiu quase como um respiro: diante da impossibilidade de se apresentarem, artistas locais decidiram realizar uma live para manter a cultura em movimento. O encontro deu tão certo que virou grupo – e o nome veio da própria tradição: Sipuada, uma palavra de força e resistência, evocada na pancada do carimbó.

AMAM – lançamento do doc Mestre Manin, em Ponta de Pedras – Marajó. Foto: Holofote VIrtual/Luciana Medeiros

Hoje, a Cipuada reúne cerca de 25 integrantes, entre músicos e dançarinas, com um núcleo de oito artistas que responde pelas apresentações em outras cidades. “Tem muito violão, flauta, ganzá, maraca, banjo… é uma formação rica e plural”, afirma Mateus.

O Sipuada além de grupo se tornou também um projeto cultural que traz como motivação fortalecer o carimbó marajoara, que ainda enfrenta invisibilidades.

“A gente não pode deixar acabar. Aqui no município tem muita coisa rica e a cultura precisa ser valorizada. Nosso papel é manter esse padrão vivo”, conclui Mateus, com a firmeza de quem já entendeu que fazer música no Marajó é também um gesto político de permanência.

E foi assim… O carimbó tomou conta da AMAM e a festa encerrou com o coração batendo no compasso da tradição. Aos 95 anos, Mestre Manin segue sendo farol para as novas gerações — e, agora com sua história documentada, torna-se também memória viva para o futuro.

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