Visitem a exposição “Um Imenso Estranhamento com a Natureza: Fotografia e Memórias”. Por trás das imagens esmaecidas que a compõem, há um gesto delicado de reconstrução da memória. A nova imersão visual de Guido Elias, está aberta na Kamara Kó Galeria, em Belém, até 18 de maio.
O artista, que também é pesquisador em poéticas visuais, mergulhou em negativos esquecidos, álbuns antigos e lembranças de infância para transformar o acervo familiar em narrativa sobre o tempo e o afeto.
“Meu contato com as fotografias familiares é muito antigo. Sempre estive cercado por muitas imagens na casa da minha mãe e das minhas avós”, conta Guido.
A exposição nasce como desdobramento de seu trabalho de mestrado de mestrado em Poética Artística pela Universidade Federal do Pará, com bolsa CAPES, e propõe uma reflexão sobre como as imagens podem acionar e reorganizar memórias, criando camadas de sentido entre o presente e o passado.
A pesquisa veio com a perda da avó materna, guardiã da memória visual da família. E foi nesse rompimento, que o artista encontrou o impulso para transformar a dor em criação. “Fui escanear os negativos que estavam na casa. Revelar digitalmente fotos que nunca tinha visto foi como reviver aquilo tudo.”
“Ela tinha uma Polaroid. Era mágico: tirava a foto e ela saía na hora. Quando ela faleceu, a casa dela ficou abandonada, foi invadida. E aquilo, que pra mim era um espaço de sonho, que eu vi chegar ao fim.”

A exposição traz cerca de 30 imagens, além de instalações com monóculos e outras experimentações visuais que fazem das fotos um campo expandido da memória. “A imagem agora não é mais só a fotografia. É como se fosse a própria lembrança: esmaecida, sobreposta, às vezes inventada, pois algumas lembranças não são realmente vividas, elas nos são contadas e nós as completamos com a imaginação.”
O processo de pesquisa envolveu mais de 500 imagens de diferentes núcleos familiares – materno, paterno, imagens feitas pelo próprio artista e composições que misturam tempos, afetos e espaços. “Eu considero tudo montagem aqui. Cada fotografia tem várias camadas, como se fossem planos do silêncio da lembrança.”
As casas da infância, os pátios vividos, os objetos de afeto reaparecem em fragmentos. “A casa da minha avó foi onde vivi grande parte da minha infância de forma mágica. Ela criava um ambiente pra gente que era realmente casa de vó.”

O reencontro com essas imagens, segundo o artista, foi também uma forma de impedir o apagamento. “É uma tentativa de manter viva uma história que poderia desaparecer. Tirar essas fotos do álbum – ou dos negativos – e dar a elas outro lugar é um gesto de resistência. E também de celebração.”
Guido apresenta a mostra na Kamara Kó, galeria dedicada à fotografia e que ele conhece de longa data. “Essa história de relação já tem uns sete, oito anos. Em 2017 fui premiado no Diário Contemporâneo e ali comecei a me aproximar do circuito artístico de Belém. Depois fiz estágio aqui e fui convidado a participar dos coletivos de fim de ano. Agora, apresentar meu trabalho solo neste lugar é muito especial.”
A exposição abriu no último domingo, na 55a edição do projeto Circular Campina Cidade Velha, reafirmando o poder da fotografia não apenas como documento, mas como arte viva, capaz de nos devolver aquilo que a passagem do tempo insiste em desfocar.
PROGRAMAÇÃO
Com curadoria de Ceci Bandeira e Letícia Carvalho, a mostra convida o público a refletir sobre a relação entre imagem, memória e paisagem, em uma roda de conversa, no dia 27 de abril, domingo, às 10h30.
Já no domingo seguinte, 4 de maio, também às 10h30, haverá visita guiada com Guido Elias, com oportunidade de percorrer a mostra ao lado do artista e conhecer mais de perto as histórias por trás das imagens. A mostra vai até 18 de maio, domingo, com uma finissage das 15h às 18h.
A visitação está aberta mediante agendamento prévio, que pode ser feito pelo e-mail guido.elias@gmail.com ou pelo telefone (91) 99162-7799. Entrada gratuita, na Kamara Kó Galeria – Trav. Frutuoso Guimarães, 611 – Campina – Belém-Pa.