Em 2015, a TV Cultura do Pará estreava um novo programa dedicado a cena artística e cultural, o Circuito, que tinha a proposta não somente de compor uma vitrine para tornar esta produção visível, como também um espaço de parceria para criação artística.
Não a toa o programa produziu videoclipes, videoartes e obras experimentais que para muitos artistas foi fundamental para começar um portfolio. Em outros casos, artistas já consolidados encontraram no programa uma oportunidade de exercitar obras que não eram contempladas por editais públicos, quando raramente haviam.
Na quele ano, a sétima edição do programa Circuito trazia uma matéria especial sobre “videodança”, campo híbrido de experimentações que aproximava a dança do cinema em suas diversas possibilidades. A reportagem destacava a atuação dos coreógrafos e pesquisadores Ana Flávia Mendes e Danilo Bracchi, ambos com trabalhos no campo da videodança.
Bracchi já havia realizado a videodança “Acalmia” (2010), em parceria com a realizadora e professora Ana Lúcia Lobato e o diretor de fotografia Marcelo Rodrigues, obra na qual investigam o corpo em situação de maré e as possibilidades de composição de movimento e construção de um tempo em suspensão a partir do dispositivo cinematográfico.

Mas, para aquela edição especial do programa Circuito, o coreógrafo havia aceitado o desafio de realizar uma videodança. O resultado ganhou o título de “Rebuçado”, em referência a um doce conhecido no sudeste brasileiro, que dialoga com a estética dos trabalhos de Danilo no campo da dança contemporânea.
Em “Rebuçado”, atuei como assistente de direção e montador, o que já fazia na própria TV Cultura do Pará, para a realização dos conteúdos do programa Circuito.
Assim, me lancei na construção da narrativa a partir do conjunto de cenas filmadas e encadeadas ainda na pré-produção, a partir de um exercício de decupagem de cenas ocorrido durante a visita técnica ao prédio histórico da Universidade do Estado do Pará, no bairro do Telégrafo, em Belém.
Determinada a ordem de espaços onde ocorreriam as cenas, Bracchi rascunhou sequências de partituras coreográficas com os núcleos de personagens: Stilleto, B-Boys e Intérpretes Contemporâneos. De certa maneira, o encadeamento espacial e de ações compôs uma espécie de roteiro, que orientou a montagem.
A partir desta montagem, o músico Armando de Mendonça, que havia participado da coeografia, compôs a paisagem sonora sem a qual “Rebuçado” não teria sua potência. Não a toa, o trabalho de Armando recebeu menções honrosas em algumas das mostras como III Festival de Audiovisual de Belém / FAB – 2015 (Belém-PA).
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Rebuçado. Foto: Felipe Cortez
Uma década e novos encontros em videodança
Em 2025, “Rebuçado” completa 10 anos e foi recentemente exibido na “Mostra O Melhor dos Melhores do Toró”, que ocorreu no SESC Ver-o-Peso, no último dia 03 de abril. Ao longo desta década, o filme integrou as seguintes mostras e festivais:
- Cult Dance 2015 “Mostra de duos/solos e videodanças de dança contemporânea” (Brasilia-DF)
- Mostra Prosa,Video e Dança ano II – 2015 (São Paulo-SP)
- Festival Mundo – 10 anos de Guerrilha – 2015 / Mostra de Audiovisual (João Pessoa-PB)
- III Festival de Audiovisual de Belém / FAB – 2015 (Belém-PA) – Menção Honrosa pela Trila Sonora criada por Armando de Mendonça
- I Toró: Festival Audiovisual Universitário de Belém (Belém-PA) – Menção Honrosa em Videodança
- Programación Videomovimiento – Muestra Concurso Internacional de VideoDanza / VIDEOMOVIMIENTO – 2015 (Bogotá- Colombia)
- 7ª edição do InShadow – Festival Internacional de Vídeo, Performance e Tecnologias. (Portugal-Lisboa)

A partir daquele primeiro contato com a videodança e suas possibilidades, realizei como diretor e montador, também em parceria com Danilo Bracchi como intérprete, a videodança “Dancer Fassbinder” (2016), personagem inspirada no teatro de Luis Otávio Barata e no cinema de Rainer Werner Fassbinder, em parceria do Studio Reator, Coletivo Lumiar e TV Cultura do Pará.
Já em 2018, fui convidado pelo Laboratório de Cinema do Corpo da Casa das Artes a realizar o workshop “Encontros em Videodança”, que convocada artistas de deferentes linguagens da cena (dança, teatro, circo, performance, etc) a pensar e produzir videodança.
Disso resultaram três interessantes trabalhos, onde atuei como consultor de set e montador, posteriormente: (1) Corpo-Maré (co-direção de Priscila Cobra e Samilly Maré); (2) A Carne do Vento (direção Cled Cardoso) e (3) A Caixa de Pandora (co-direção Lu Borges e Marina Trindade).
Em 2018, no 27o Encontro da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas (ANPAP), realizado na UNESP, tive a oportunidade de apresentar o artigo “Videodança ‘Rebuçado’: da Cena para a Tela”, onde debato o processo de criação em videodança de “Rebuçado”. Para acessar o artigo, basta clicar aqui.
Por fim, considero que “Rebuçado” em 2015 encadeou esta série de encontros em videodança, e marca a minha relação de parceria criativa e amizade com Danilo Brachhi e uma diversidade de artistas interessados no experimento, na interface e na possibilidade de errar rumo a novas formas expressivas.
*Felipe Cortez é diretor e roteirista. Mestre em Artes, atua como professor no curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Pará.