Acordes do Círio (2017). Foto: Débora Flor.

Morre Mestre Laurentino, o roqueiro mais antigo do Brasil, aos 98 anos

O Pará se despede de um de seus maiores ícones culturais. Mestre Laurentino, músico paraense e figura central na cena musical do estado, faleceu na tarde deste sábado (21), aos 98 anos, em sua residência, em Belém, de morte natural, segundo informou a filha Greyce dos Santos Corrêa, com quem ele vivia em uma casa no bairro da Sacramenta.

A coleção de roupas cintilantes, a gaita inseparável e uma energia invejável marcaram sua trajetória até o fim. Eu nunca vou me esquecer nos anos 1990 ainda, quando havia shows na Praça da República e aquele senhor negro, com os dedos cheios de anéis e pulseiras aparecia, chamando atenção ao acompanhar as bandas tocando sua harmônica ali mesmo da plateia.

Não sabia exatamente quem era ele até que um belo dia, me aparece a figura na redação do Diário do Pará, para informar que havia recebido uma placa de reconhecimento, se não me engano, da Câmara dos Vereadores. Alguns anos depois, já o vi gravando com o Coletivo Rádio Cipó, com quem ele se apresentou em terras londrinas, levando a força da música amazônica ao London International Festival of Exploratory Music.

Mestre Laurentino naquele palco representou um elo entre culturas, um catalisador de emoções que atravessaram fronteiras. Depois disso foram inúmeros outros shows e participações. Nos últimos anos, embora mais resguardado, manteve-se ativo na cena musical paraense, participando de projetos que celebram a cultura local.

Em outubro de 2017 tivemos a felicidade de reunir Mestre Vieira, Sebastião Tapajós, Mestre Solano e ele, no palco do Teatro do SESI, para o show “Acordes do Círio”. Já então com 91 anos, ele abriu a cena toda com muita vitalidade e levantando o público que emocionado o aplaudiu de pé. Em dezembro de 2022, aos 96 anos, ele participou do lançamento do álbum “Metaleiras da Amazônia”, contribuindo com a faixa “São Paulo (Terra dos Bandeirantes)”

Sua amizade com o baixista e produtor cultural Carlos Maciel Gomes, conhecido como MG Calibre, foi fundamental nos últimos anos. Calibre, que tinha uma relação profissional, mas principalmente de afeto, de um filho, com Laurentino há mais de 20 anos, era responsável por produzir eventos e gerenciar as apresentações do mestre, além de dar apoio a ele cuidando de sua saúde e bem-estar.

Lourinha Americana atravessou fronteiras

Foto: Débora Flor – Bastidores de Acordes do Círio, com MG Calibre e Laurentino.

Nascido em 1º de janeiro de 1926, em Ponta de Pedras, no arquipélago do Marajó, João Laurentino da Silva cresceu em Belém após ser adotado por uma família local. Foi com uma gaita dada por sua mãe adotiva que iniciou a trajetória na música, tornando-se um virtuoso do instrumento.

Ao longo de sua carreira, Laurentino passeou por diversos gêneros musicais, como jazz, bolero, valsa e mazurca. No entanto, foi no rock que encontrou seu lugar definitivo, recebendo o título de “o roqueiro mais antigo do Brasil”.

Sua composição mais famosa, “Lourinha Americana”, atravessou fronteiras e foi regravada por artistas como Gilberto Gil e Mundo Livre S/A, consolidando seu nome na história da música brasileira. Com figurinos vibrantes e performances cheias de energia, Mestre Laurentino conquistava plateias de todas as idades e se manteve nos palcos até os últimos anos de vida, celebrando a cultura do Pará e inspirando novas gerações.

Aos 18 anos, antes de se consolidar como músico, Laurentino acumulou experiências diversas: foi boxeador, ajudante de pedreiro e mecânico de aviação. Essas vivências moldaram sua personalidade irreverente e determinada, traços refletidos em sua arte.

A morte de Mestre Laurentino representa uma perda irreparável para a música brasileira e para a identidade cultural paraense. Sua trajetória levanta a reflexão sobre a importância de reconhecer e valorizar grandes mestres enquanto ainda estão vivos.

O legado de Mestre Laurentino segue vivo na memória coletiva e na sonoridade do Pará. A família ainda não divulgou informações sobre o velório e sepultamento. E pra gente relembrar a energia e o talento de Mestre Laurentino, vejamos sua performance da icônica “Lourinha Americana”. Na galeria, as fotos são de Débora Flor.

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